sexta-feira

Mitos e ilusões na política gaúcha

Os sucessivos escândalos envolvendo os governos Yeda e Fogaça em pleno “estado mais politizado” do país certamente fazem cair por terra a alcunha, se é que ela teve justeza em algum momento.
Sempre desconfiei dessas denominações, em geral mal escondem um certo sentimento de “superioridade” com os demais estados ou ao próprio Brasil, com um forte apelo conservador. Felizmente, não vivemos em tempos de que esses tipos de construções conseguem angariar algum apelo popular para além do residual. Mas ainda sim, o uso político desse mito é feito de outras formas, talvez menos explicitas.
Uma delas, e que quero me deter, é a utilização desta suposta singularidade local como forma de “blindar” os governos conservadores. Não é um fenômeno novo e se fundamenta, por vezes, na tática de “jogar luzes” em alguns aspectos específicos, ainda que periféricos, da política local para criar uma diferenciação ilusória, desconsiderando todo o resto. Um exemplo clássico disso é o PMDB, aqui ele ainda é o “velho MDB”, no resto do país é um partido corrompido que se detêm apenas a cargos em governos e negociatas. O apoio e a participação ativa do PMDB no governo Yeda ao longo de toda a gestão e na defesa do governo, para as portas da eleição sair da gestão e se apresentar como “novidade” não é um mero casuísmo eleitoreiro, mas sim um ato de “coerência”.
Quando isso se desdobra para os governos da direita gaúcha, a lógica do “dois pesos e duas medidas” se faz valer em toda a sua potência. De forma simbólica, se trabalha com um imaginário político de que as dificuldades de nosso estado não são causados por problemas dos atuais governantes, mas por casualidades, acontecimentos insólitos da natureza, pela “desunião” causada pelos radicais da esquerda, por “erros” do governo federal e inúmeras outras tergiversações . Para exemplificar, o problema da crise econômica do RS, não é pela farra das isenções fiscais, pela falta de projeto político dos sucessivos governos conservadores ou neoliberais que se instalaram no Piratini, o problema está “lá” e não “aqui”.
A fragilidade dessa lógica é evidente e muitas vezes de difícil convencimento, no entanto, ela tem seu apelo, mesmo que tangencialmente. Alimentada de forma permanente pelos setores conservadores (partidos da direita, mídia, grande burguesia, etc.) como forma de maquiar o que realmente ocorre.
De que outra forma poderíamos compreender que, uma governadora atolada em uma mar de denúncias de corrupção, com um governo inoperante, segue governando e, por incrível que pareça, irá concorrer a reeleição? De que forma se explicaria que um prefeito com um governo fraco e paralisado, com denúncias graves de corrupção (inclusive tendo um secretário assassinado) concorre com ares de favoritismo pela mídia?
A tática de escamotear os reais problemas, gerar falsos dilemas e apresentar soluções ainda mais frágeis não passa de uma estratégia que tem por fim o objetivo de permanecer o mesmo estado de coisas. Tudo isso como forma de manter alguns privilégios, e principalmente, permanecer os “esquemas” de alguns poucos que se locupletam a anos.
O maior perigo deste modus operandi na política gaúcha é a tentativa de asfixia prematura de qualquer possibilidade de rompimento com isso. A candidatura que se “aventurar” a romper com esta lógica sofre o risco de ser taxada de “radical” ou, o que é pior, simplesmente ser relegada a um papel secundário na disputa política pela mídia.
Alternativas para romper com esse cerco existem. Elas, em geral, não são as mais fácies, no entanto, são as mais necessárias. Do contrário, seguiremos vendo uma reiteração de uma mesma política cujo a única mudança é se será A ou B, mas com o conteúdo e, o que é mais trágico, com os mesmos erros e descaminhos que assolam o estado.