segunda-feira

Dois setembros que abalaram o Império

Por uma coincidência, foram em um mês de setembro que a última década registrou dois acontecimentos carregados de forte simbolismo e que serviram para trazer a tona o processo de declínio do imperialismo americano: os ataques ao World Trade Center em 2001 e a quebra do banco Lehman Brothers em 2008.
Esses acontecimentos, ainda que não possuam uma ligação direta entre si, sinalizam fragilidades e deficiências que já eram sentidas no seio dos Estados Unidos há algum tempo. Ambos cumpriram um papel de sinalizar ao conjunto dos povos de todo o mundo que o “Império está nu”. Com isso, se coadunam um processo combinado de fragilidade do tripé por qual se mantinha o poderio norte-americano sobre o resto do planeta. Esse tripé é basicamente formado pelos domínios: econômico, ideológico e militar.
Os três vêem sofrendo sucessivos abalos como nos coloca Immanuel Wallerstein. “Há cinqüenta anos, a hegemonia dos Estados Unidos no sistema-mundo baseava-se em uma combinação de eficiência produtiva que superava de longe a de qualquer rival, uma agenda política mundial que era calorosamente apoiada por seus aliados na Europa e na Ásia, e uma superioridade militar. Hoje, a eficiência produtiva das empresas americanas enfrenta forte competição, principalmente por parte das empresas dos sues aliados mais próximos. A agenda política mundial dos Estados Unidos já não é tão calorosamente apoiada por seus aliados, especialmente depois do desaparecimento da União Soviética. O que resta, no momento, é a superioridade militar.”
Os ataques terroristas do 11 de setembro causaram um duplo efeito: por um lado, mostravam que este poderio não era suficiente para impedir um ataque de um grupo terrorista em seu próprio território e por outro serviu de estopim para uma nova e maior escalada militar. Procurando assim, através deste expediente recuperar a dianteira em seu processo de hegemonia. Ancorados em sua vantagem militar sobre seus aliados e rivais, durante o Governo Bush, a face militarista foi posta como “(...) o trunfo mais forte dos Estados Unidos; na verdade seu único trunfo. Hoje, os Estados Unidos possuem o mais formidável aparato militar do mundo.” Sendo esta vantagem sobre o resto do mundo consideravelmente maior hoje do que era apenas há uma década.
No entanto, mesmo com toda esta vantagem, as duas guerras simultâneas impetradas pelos EUA apenas se arrastam e não obtiveram a plenitude dos resultados esperados por eles. Ainda que tenham derrubado os Talibãs no Afeganistão e Saddam Hussein no Iraque, em nenhum dos dois países a situação esta controlada, pelo contrário. O número de mortos apenas aumenta, já chegando aos milhares. E o que é pior para os interesses imperialistas dos norte-americanos, os conflitos estão longe de se encerrarem nas duas frentes.
A única solução será uma retirada e o reconhecimento do fracasso das pretensões de estabelecer regimes pacificamente alinhados aos interesses dos EUA. Ainda que conte com o apoio de setores das elites locais, a situação política interna, tanto do Iraque como do Afeganistão é de forte resistência interna.
O setembro de 2001 marcou o inicio dessa escalada fracassada das armas e da “paranóia Bushiana” de medo permanente: medo pelo diferente e pelo “de fora”. Não é a toa que a extrema-direita tem atacado insistentemente Barack Obama por não dar continuidade a este aspecto da política do Bush, e por ser ele um descendente de Africanos, logo, foge do estereótipo de pureza Anglo-saxônica.
O ano de 2008 foi marcado por outro setembro que viria a abalar as estruturas dos Estados Unidos, que foi o “estouro” da chamada Crise do Capital Financeiro. Que, como uma onda avassaladora, atingiu ao conjunto das potências centrais do capitalismo.
O Lehman Brothers era o quarto maior banco de investimentos dos Estados Unidos, um dos maiores operadores de empréstimos a juros fixos de Wall Street. A sua queda produziu o efeito “cascata” do estouro de uma crise que já se desenhava e que apenas iria arrastar-se em uma seqüência avassaladora sobre o centro do capital financeiro. O efeito simbólico da quebra foi muito forte e de duras conseqüências para o “consenso neoliberal”, cada vez mais desacreditado.
A crise, ao contrário do que bradam alguns analistas míopes, não começou a partir desses eventos, mas vêm de um longo processo de crise estrutural do modo de produção dominante. A desaceleração do processo de acumulação nos Estados Unidos já ocorre desde meados da década de setenta, após a crise do petróleo. Ainda que tenha registrado alguns “saltos” de aceleração econômica, principalmente na década de noventa, esse crescimento tem se mantido em patamares muito inferiores aos que eram obtidos durante os “anos de ouro” do capitalismo global, a partir do pós-guerra.
Os efeitos que a crise em curso terão, ainda está por ser melhor equacionado. Ainda não se vislumbra o esgotamento do processo de crise do capital, visto que até o momento pouco ou nada se fez para coibir as verdadeiras causas. Ela não se resolverá com medidas paliativas, apenas com mudanças estruturais, que até o momento, não se apresentam de forma concreta no centro do capitalismo (Estados Unidos, Europa Ocidental e Japão).
Para a manutenção do processo expansionista do imperialismo norte-americano, a crise do capital venho abalar e frear este ímpeto. Possivelmente, daqui alguns anos teremos melhor presente os efeitos do acelerado declínio e perda gradual da capacidade hegemônica dos Estados Unidos.
Ainda que enfraquecida, não se vislumbra quando e como se esgotara essa posição de liderança absoluta no sistema. As possibilidades apontam para uma multipolaridade que não esteja submetida pelo controle de uma única nação. É importante destacar que esta situação segue no campo das possibilidades, e como tal é objeto de disputa, sem resultados pré-determinados e garantidos. Finalizando, tem uma frase do Wallerstein que ilustra bem o processo que está em curso. “A verdadeira questão não é se a hegemonia dos Estados Unidos está em declínio, mas sim se os Estados Unidos conseguirão encontrar uma forma de cair graciosamente, com danos mínimos para o mundo e para si próprios.”

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