sábado

A charge explosiva

Um fenômeno que raríssimas vezes acontece é vermos a grande imprensa, de um modo em geral, fazer autocrítica sobre o seu papel e sobre o que noticia.
A explosão de revolta islâmica, que se iniciaram em uma série de países árabes (Líbano, Irã etc.) e rapidamente espalharam-se para diversos países inclusive na Europa, motivados por uma charge pejorativa ao profeta Maomé publicada em um jornal dinamarquês e reproduzida em outros jornais europeus. As manifestações de protesto a publicação rapidamente tomaram um caráter violento, atingindo a embaixadas e consulados europeus. Sem contar um grande número de feridos e mortos nas manifestações.
A forma como a grande mídia, de um modo em geral, noticiou os acontecimentos seguiram, grosso modo, duas linhas: por um lado condenando as manifestações violentas (questionáveis), mas também disseminando uma imagem de irracionalidade aos povos islâmicos que segue a cartilha estadunidense de ridicularização e de disseminação do "medo árabe". E por outro, de condenar a atitude do jornal dinamarquês de publicar a charge, por ser ofensiva para os islâmicos, devido ao contexto de crise colocada.
A violência ocorrida, evidentemente, carrega consigo um traço de totalitarismo marcante ao extremismo islâmico. Que deve ser compreendido e buscado a sua superação, pelo seu caráter segregatório, autoritário e alienante.
Mas também deve ser levada em conta, a longa campanha norte-americana (e seguida por boa parte dos países ocidentais) de "demonização" dos povos árabes. Que trabalham estereótipos de associação de que "árabe" e "islâmico" é sinônimo de extremismo religioso, terrorismo, atraso e etc.
Não é um grito irracional contra apenas uma charge. Carrega consigo toda uma reação ao processo perverso da verdadeira campanha em curso de segregação árabe e islâmica. Carrega junto um forte componente de fundamentalismo religioso, de conseqüências também extremamente nefastas. Fatores estes que tem sido "esquecidos" na cobertura midiática.
Cabe a grande imprensa passar por profundas mudanças que tenham um caráter verdadeiramente democrático. E que também não se coloque, como neste e em muitos outros casos, como sendo a portadora de uma "verdade neutra e absoluta".
Um bom jornalismo passa, necessariamente, por buscar mais do que colocar os fatos de maneira isolada, mas sim buscar apresentar minimamente uma noção do todo. Fugindo a maniqueísmos e interesses que fogem a "simples" notícia.

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